sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

Soltando a Corda

por Christine Dunford

Se eu determino (crio) pelo coração, quase tudo se realiza; se eu determino usando a mente, quase nada se realiza. 
Marc Chagall

Quando eu fui apresentada ao Budismo de Nitiren, eu tive uma profunda revelação de como limitada era a minha fé devido a uma infância de pobreza que continuava me assombrando. Apesar de já ter escapado desta vida e estar vivendo com muito sucesso material, eu continuava operando da perspectiva de medo e de precisar controlar TUDO.

Eu cresci num ambiente de caos. Meu pai trabalhava esporadicamente e quando conseguia emprego era sempre como garçom, o que era irônico porque ele era um alcoólatra, e a minha mãe era trocadora de ônibus para uma empresa local.

Nós vivíamos num minúsculo apartamento de 3 quartos no Bronx, com pouquíssimas janelas, e a vista de todas as janelas era a mesma – um muro de tijolos. A vida de quase todos os meus amigos era tocada, de alguma forma, pelo álcool, drogas, violência física ou abuso sexual.

Eu não posso dizer que existiu 1 dia na minha infância onde eu não estava com medo. Eu estava com medo em casa, eu estava com medo na minha escola católica também – onde a única forma de não ser punida ou humilhada era tentar ser perfeita. Eu era internamente nervosa e destruída. O único remédio que eu consegui encontrar para o meu medo e ansiedade foi uma ambição feroz e controle.

De certa forma, isso funcionou para mim. Eu me tornei uma estudante nível A, ganhei uma bolsa de estudos na Julliard e me tornei uma atriz. Eu ganhava muito dinheiro, morava numa casa maravilhosa e tinha muita coisa, tudo o que queria. Eu tinha um certo orgulho falso porque acreditava que eu tinha criado o meu sucesso através do meu esforço, foco, suor e minha determinação; eu era totalmente definida pela dificuldades que enfrentei e como isso parecia funcionar para mim, eu me viciei nisso.

Quando eu não podia estar no controle de cada aspecto da minha vida, eu ficava em depressão e reclusa, afundada em vergonha até eu conseguir estar no controle e ter sucesso em alguma coisa. Eu não poderia nunca admitir imperfeição, e eu também não podia nunca pedir ajuda alguém. Era isolação e exaustão, mas qualquer coisa era melhor do que me sentir vulnerável.

O fato deu eu ter conhecido e casado com o meu marido, com quem eu tive o meu primeiro relacionamento íntimo, é a prova da sua marcante natureza e paciência. Ele me deu suporte durante os meus altos e baixos sem nunca me julgar.

Eu realmente achei que tinha o controle da minha vida até eu me tornar mãe. Ter uma criança é uma espécie de estranho experimento de  ficção cientifica onde alguém tira o seu coração do corpo e coloca pequenas pernas nele e envia ele para uma rua movimentada.

O amor que senti pelo meu filho foi tão grande, eu nunca tinha sentido antes aquele sentimento tão profundo e forte. Foi maravilhoso e, também, assustador.

Eu atingi o meu pico de vulnerabilidade quando meu marido e eu ficamos sabendo que nosso filho iria precisar de uma cirurgia. Eu lidei com isso no meu modo usual, respondendo ao medo com massiva quantidade de pesquisa. Eu passei horas e horas na internet estudando o seu problema. Apesar de ter aprendido tudo o que tinha para ser aprendido sobre a cirurgia, estava tudo fora do meu controle – foi traumático.

O pior momento da minha vida foi quando o meu filho de dois anos e meio foi carregado pela enfermeira, para a sala de operação, gritando e chorando e eu não podia fazer nada para ajudar.

Apesar do sucesso da cirurgia e eu estar muito grata por meu filho estar bem,  internamente eu sentia como se tivesse negligenciado ele, falhado em protege-lo. Eu fiquei muito depressiva em relação a isso e muito empenhada em encontrar uma forma de me livrar dos meus medos e necessidade de controle.

Foi nesse período que eu conheci o Budismo de Nichiren Daishonin. Minha experiência com a meditação ( daimoku ) começou por entoar o mantra determinando a minha mudança interna, a felicidade do meu filho e bem estar de toda a minha família.

Pouco tempo depois, uma amiga me deu o livro Educação para uma Vida Criativa do
Tsunessaburo Makiguti, fundador da Soka Gakkai. Eu tive profundas percepções com este livro. Eu cheguei a conclusão que não ia proteger o meu filho através do controle de cada aspecto de sua vida; e que não o protegendo de todas as dificuldades que, ele possivelmente, enfrentará na vida, não significa que estou sendo uma mãe ruim. Assim eu fui capaz de reconhecer  que a vulnerabilidade que eu sentia, como mãe, era uma expressão natural do grande e mais profundo amor que eu jamais tinha sentido na vida.

Eu, então, determinei que me  transformaria para que eu pudesse ter a responsabilidade e caráter adequados a este amor e para encontrar maneiras mais valorosas de expressar ele.

Quando eu me sentia “dominada” pela responsabilidade de criar um filho, eu meditava e meditava, até que eu finalmente vi que o meu desafio como mãe é aprender a viver com aquele amor imenso e com pouco controle.

Apesar de procurar criar uma vida que blindaria o meu filho e o protegeria  das dificuldades que eu passei; se eu continuasse operando com base no medo, eu estava arriscando passar para ele a mesma fé limitada que eu tinha. E se eu fizesse isso, então eu provavelmente estaria criando ele no mesmo gueto que eu lutei tanto para me livrar.

Eu fiz daimoku para ter coragem de aceitar o desconhecido. Eu fiz daimoku para acabar com a necessidade que eu tinha de manipular tudo. Mais importante, eu meditei para se capaz de aceitar ajuda de outras pessoas.

A primeira oportunidade para ver se a minha mudança interna estava acontecendo de verdade veio quando estávamos preparando o nosso filho para a primeira experiência escolar.

O processo gradual e carinhoso de adaptação que tinha sido descrito para os pais durante a nossa visita a escola e entrevista, não estava evidente em nenhum lugar. Meu marido foi colocado numa situação de desconforto e encorajado a não permanecer na escola, mesmo no primeiro dia. No segundo dia, a diretora o pressionou a ir embora. Meu marido mais uma vez se sentiu alienado pela diretora e eles discutiram sobre o processo de adaptação. Havia muita tensão e irritação no ar, o que acabou fazendo com que a diretora chamasse o meu marido de “arrogante”.

Eu me senti ficando irritada e mais na defensiva a cada minuto. Eu lutei contra muitos impulsos de confrontar a diretora. Então, eu me lembrei de tudo que eu vinha pensando, lendo e aprendendo, e ao invés de “explodir”, eu fui para casa e meditei.

Antes eu teria “quebrado as paredes”, e fazendo isso eu teria acabado com qualquer chance de encontrar uma solução. Mas agora, apesar do meu sentimento intenso de vulnerabilidade e medo, eu continuei meditando.

Na próxima vez que o meu marido levou o meu filho na escola, a situação tinha mudado completamente. A diretora o incentivou a permanecer no local pelo tempo que ele quisesse, explicando a ele que o processo de separação dos pais e adaptação na escola era muito delicado. Meu marido ficou surpreso e feliz, mas sem entender o que causou tamanha reviravolta na cabeça da diretora.

Então ficamos sabendo que o filho de uns amigos frequentava a mesma escola e ao informar a diretora da eminente cirurgia da criança, eles contaram a nossa experiência hospitalar com o nosso filho.

A diretora disse para o meu marido, “ quando uma família já passou pela experiência de uma separação traumática, é importante que a escola trate o período de adaptação com sensibilidade e no tempo que seja confortável para a criança.  Ela precisa ser emponderada pela situação e entender que pode confiar  em nós. “

Eu nuca imaginei tamanha sensibilidade vindo daquela mulher. Se eu tivesse respondido à situação na minha forma costumeira, ela nunca teria tido a chance de se revelar de uma  forma  tão profundamente  humana.

No dia seguinte o meu marido deixou o meu filho na porta da sala e ele disse: “ você não tem que ir para o trabalho? Pode ir”.  E foi isso, ele se sentiu seguro e feliz na escola a partir daí.

Tudo isso aconteceu sem que eu tenha feito que isso acontecesse. Isso aconteceu sem força, sem manipulação e o mais importante foi meu filho observar a forma que este problema foi resolvido.

Alguém uma vez disse que GUETO É UM ESTADO MENTAL, e o que eu percebi quando comecei a meditar foi que apesar de ter mudado de meio ambiente radicalmente quando adulta, eu nunca iria conhecer a felicidade se não mudasse o ambiente que existia na minha mente; e o ambiente da minha mente era absolutamente dominado pelas limitações do meu passado.

Eu nunca pensei que algo pudesse promover esta mudança interna, até que o mais profundo e inspirador amor pelo meu filho me fez desejar isso e o BUDISMO me mostrou COMO FAZER.


Tradução não oficial do livro: The Buddha Next Door, ordinary people, extraordinary stories.
Autores: Zan Gaudioso e Greg Martin
ISBN: 978-0-9779245-1-6