terça-feira, 27 de janeiro de 2015

Felicidade

Cathy Robinson

Não é a alegria que nos faz ter gratidão, é a gratidão que nos faz ter alegria. 
David Steindl-Rast

Após 10 anos num casamento maravilhoso, meu marido e eu decidimos ter um filho, mas eu não conseguia ficar grávida. Nós fomos a um especialista, eu tomei injeções e também tentei inseminação artificial – nada funcionou. Desejar um filho e se decepcionar mês após mês e ano após ano, foi extremamente doloroso. Isso fez surgir em mim,  um sentimento de não ser adequada, anormalidade – baixa autoestima.

Durante este período, meu marido desenvolveu diabetes tipo I. Nós acabamos indo muito ao hospital porque não sabíamos que ele tinha essa doença. Ele não teve condições de  trabalhar por um tempo, e não estava ganhando dinheiro suficiente – então, ficamos muito endividados. Mas eu sempre conseguia renovar as minhas esperanças através da  meditação budista.

Após 6 anos de tentativas não sucedidas de ficar grávida, eu decidi ir ao Japão para um treinamento budista, como eu tinha feito antes, quando precisei de uma sustentação espiritual. Eu comecei a guardar um pouquinho de dinheiro toda semana, determinada que eu e o meu marido iríamos ao Japão. Assim, eu consegui salvar o suficiente para a nossa viagem.

No Japão, nos encontramos com um veterano budista que dividiu o seu relato de vida conosco. Ele nos  disse que tinha tido um câncer de garganta gravíssimo e que os médicos o deram 6 meses de vida. Ele se recusou a aceitar o prognóstico e continuou a meditar 7 horas  por dia durante 6 meses. Isso foi a 7 anos atrás e ele continua vivo e agora meditando 3 horas por dia.

Ele me disse que eu precisava ter 100% de fé, 100 % de certeza e que apesar de ser muito importante ter médicos acompanhando o tratamento, eu não deveria deixa-los me abalar com a “sua ciência” ou nenhuma outra pessoa. Eu deveria ter 100% de fé e 100% de confiança acima de qualquer coisa ou pessoa.

Eu tinha que saber e acreditar que poderia ficar grávida e meditar com a mesma determinação que ele entoou o mantra na sua luta para vencer o câncer. Ele me deu de presente um juzu e um cachecol para o meu futuro bebê e nós voltamos para casa.

Eu meditei até chegar ao ponto que eu percebi que não importava ficar ou não grávida, que eu poderia ser feliz de qualquer jeito. 

Eu fiquei grávida, mas perdi o bebê, foi uma gravidez ectópica. Eu continuei determinada, porque agora, pelo menos, eu sabia que podia ficar grávida – sem drogas ou procedimentos artificiais, apenas meditando com bastante determinação e fé. Seis meses depois, eu fiquei grávida novamente e consegui levar a gravidez até o fim – o bebê nasceu a termo.

O nosso filho é maravilhoso, uma criança incrível. Ser mãe tem sido a maior experiência da minha vida. Tudo que aprendi no passado ajudou a me tornar uma mãe melhor.

Quando o meu filho fez 8 anos, eu comecei a desenvolver uma dor horrível no ombro e fui à um ortopedista. Um exame revelou um tumor na minha espinha que tinha que ser removido imediatamente.

Após a cirurgia, eu fui imobilizada do meu pescoço à cintura, eu tive que ficar assim por 4 meses.

Enquanto ficava deitada na cama do hospital, fazendo daimoku ( meditação), eu tive uma experiência profunda. Eu entendi porque tinha que passar por isso para mudar a minha vida e o meu destino.

Eu tinha 48 anos de idade naquele momento. Minha mãe tinha 48 anos de idade quando ela tentou se matar pulando de uma janela. Ela sobreviveu a queda, mas foi imobilizada do pescoço até a cintura. Aqui eu estava, na mesma idade e na mesma situação – imobilizada do pescoço à cintura. Apesar de motivos diferentes, as duas experiências poderiam ter finalizado as nossas vidas aos 48 anos de idade.

Um ano após essa tentativa, a minha mãe se matou com comprimidos. Eu fiz um juramento de mudar a propensão destrutiva da minha família. Eu estava determinada!

De acordo com o budismo, é possível atingir a sua família 7 gerações passadas e 7 gerações futuras. Qualquer coisa que eu precisasse fazer para ter sucesso nisso, eu estava preparada para enfrentar.

Enquanto eu estava deitada e imobilizada no hospital, eu sabia que eu já estava mudando este karma familiar. Eu estava mudando isso fisicamente, emocionalmente e mentalmente. Eu me sentia livre apesar de estar numa prisão física.

O resultado da biópsia mostrou que o tumor era câncer – eu tinha linfoma. Eu estava com medo, mas eu meditei ( entoei o mantra), e muitos amigos budistas vieram entoar o mantra ( fazer daimoku) comigo. Eu tinha que deitar no meu sofá e rolar para conseguir levantar. Eu não podia tomar banho sem alguém para me ajudar, eu não podia dirigir ou cuidar bem do meu filho.

Os amigos do meu grupo budista vieram com alimentos, presentes e até se ofereceram para limpar a casa para mim. Eu não podia acreditar o quão afortunada eu tinha me tornado. Eu sabia, por essas mudanças no meu ambiente e relacionamento com as pessoas, que eu tinha mudado a minha vida e o karma da minha família ( esho funi, inseparabilidade do ser e seu meio ambiente).

Quando meus pais morreram, eu estava sozinha, eu não tinha ninguém. Agora eu tinha tantas pessoas me dando apoio que eu pensei que o meu coração fosse explodir de GRATIDÃO.

Apesar disso, eu estava aterrorizada com o diagnóstico de câncer. Eu procurei orientações com um budista veterano que me conhecia desde o início da minha prática budista. Eu disse:

- Eu me sinto despedaçando, com a minha esperança indo embora. Eu estava tão forte durante a cirurgia, mas agora, sabendo que o tumor é câncer, eu não sei se consigo levantar a minha fé e esperança novamente.

- Cathy, durante toda a sua vida você tem sido muito emotiva, mas por baixo desta emoção você tem  sido, sempre, muito forte. Todas as experiências que você tem tido como budista te transformou na pessoa que você é hoje. Você não pode se deixar abalar pelo seu emocional, pela superfície do que você realmente é. A força que irá te impulsionar  para vencer este desafio está DENTRO de você.

Esse foi um importante conceito para eu entender: a noção de que ser emotiva não significa que você não seja forte ou que não possa superar adversidades.

Após a primeira quimioterapia, eu perdi todo o meu cabelo, eu estava arrasada. Cinco minutos após meu cabelo cair, por acaso, a esposa de um amigo budista  veio me visitar. Ela atravessou a porta e eu gritei: Meu cabelo caiu! E comecei a chorar.

Ela sugeriu que entoássemos o mantra ( daimoku). Ela meditou de forma tão intensa que eu sai do meu profundo desespero ( estado de inferno), me sentindo completamente confiante no futuro e no meu potencial para ser feliz.

Os tratamentos continuaram por 6 meses, todos os sinais de câncer desapareceram. Eu não apenas venci o câncer como também me tornei mais confiante na forma que a minha vida estava se encaminhando.

Eu senti que tudo estava acontecendo da forma que deveria acontecer, na ordem correta e o melhor resultado estava sendo garantido.
Eu entendi como cada momento é uma oportunidade para te ajudar a mudar e fazer a sua vida ficar ainda melhor. Eu realmente, pela primeira vez, senti que não há nada na vida que deva ser negativo. Tudo pode se transformar em algo positivo e maravilhoso ( transformando o veneno em remédio).

Pouco tempo depois, eu recebi um telefonema de uma amiga me chamando para ir meditar com uma amiga dela que tinha sido diagnosticada com câncer. Nós fomos à casa dela para incentivá-la e para eu dividir a minha experiência com ela. Essa mulher não era budista, mas ela disse que queria experimentar a meditação, então fizemos daimoku ( entoamos o mantra).

Enquanto estávamos entoando o mantra, a filha dela desceu as escadas e nos disse que 2 aviões tinham se chocado contra o World Trade Center (WTC). Eu respirei fundo, porque o meu marido trabalhava no WTC.  Eu disse: “ Nós precisamos continuar entoando o mantra.”

Por um segundo eu estava pronta para me despedaçar, mas ao invés disso, eu continuei fazendo daimoku. Eu sabia que não poderia fazer nada pelo meu marido naquele momento a não ser entoar o mantra. Nós continuamos meditando e eu senti uma sensação de paz crescendo dentro de mim. Eu estava confiante, tinha certeza, que o meu marido ficaria bem e assim, a nossa família eu senti isso profundamente.

No caminho de casa, o medo cresceu dentro de mim novamente. Eu comecei a entoar o mantra, enquanto dirigia, determinando que o meu marido estaria salvo e que nada de ruim aconteceria com ele. Quando cheguei em casa eu liguei a minha secretária eletrônica e escutei o meu marido gritando: “ Eu consegui sair, eu sai!”

Mesmo antes do 11 de setembro, eu sentia que a *paz mundial poderia ser alcançada APENAS através do respeito das diferenças individuais. Eu sou muito grata de pertencer a uma organização que acredita em Criar Valor no mundo através da criação de valor na nossa própria vida. Eu pertenço a uma religião que abraça todas as pessoas, de qualquer religião, e procura criar harmonia através do diálogo e compreensão.

Budismo continua ME SERVINDO e
 servindo ao meu mundo MUITO BEM.


* Entende-se por paz mundial a prosperidade e o bem-estar  na vida de todas as pessoas.
  
Tradução não oficial do livro: The Buddha Next Door, ordinary people, extraordinary stories.
Autores: Zan Gaudioso e Greg Martin

ISBN: 978-0-9779245-1-6