por: Anne – Marie Akin
Tudo parece mudar quando nós mudamos – Henri Amiel
Através da minha prática budista eu mudei a minha carreira
profissional; eu sou agora uma musicista e professora de arte. Eu encontrei a
mais maravilhosa companheira para minha vida, construí uma família forte e
feliz e venci inúmeros desafios – internos e externos. Eu sou uma pessoa que
vive a vida de uma forma genuína, livre e corajosa. Mas eu me encontrei
encarando um aspecto da minha vida profundamente enraizada e dolorosa que não
tinha noção que existia até que (felizmente) fui forçada pelas circunstancias a
encarar isso.
O problema começou como resultado de uma grande alegria –
após anos falando sobre isso, eu e a minha companheira finalmente decidimos ter
um bebê através de um banco de sêmen. Minha companheira, Amy, facilmente engravidou. Nós éramos como quaisquer
pais grávidos, ansiosas e cheias de expectativas – a gente mal podia esperar
para contar a novidade para os amigos e colegas de trabalho. Eu contei para a
todos os meus amigos da The Old Town School of Folk Music, onde eu sou
funcionária. Mas a maioria das minhas aulas são no programa residência que fica
no lado oeste de Chicago, um centro de assistência para crianças e famílias de
baixa renda. Eu me encontrei incapaz de contar para os meus colegas do centro
sobre o bebê que esperávamos.
No meu trabalho como professora de arte eu tinha observado
homofobia explícita e implícita. Como qualquer pessoa gay que trabalha com
crianças falaria para você, escolas infantis – em qualquer lugar - não é um ambiente onde as pessoas assumem a
sua sexualidade abertamente. Nas outras áreas da minha vida eu vinha caminhando
para me tornar cada vez mais livre, e eu de repente descubro que passei os últimos
7 anos da minha vida de professora me encolhendo e escondendo, até eu ter num
compartimento uma versão “aceitável” de mim mesma conhecida como Srta. Anne
Marie, a moça da música. Esta versão não incluía várias coisas do meu eu,
especialmente a parte que eu sou uma mulher casada com outra mulher. Eu me
esforcei tanto para “sair do armário”, para agora me encontrar de volta nele porque eu
permiti que as suposições de outras pessoas sobre mim parecessem a verdade. De
repente eu estava tendo que encarar o
stress de “sair do armário” novamente.
Eu estava num dilema muito dolorido. Aqui eu estava, semana
após semana, com pessoas que amam crianças e bebês, cantando com elas, olhando
as fotos dos seus filhos e netos, com o coração cheio de alegria sabendo que eu em breve eu teria um bebê lindo também;
e mesmo assim o meu coração estava cheio de angustia porque eu não conseguia encontrar
uma forma de contar a novidade e dividir a minha alegria. Algumas dessas
mulheres eram muito amigas minhas – mas elas não sabiam nada sobre a minha
vida! Como você se assumi gay para pessoas que você conhece há anos?
A gravidez de Amy estava cada vez mais visível e a minha
situação se tornou cada vez mais dolorida. Pessoas totalmente estranhas
perguntavam para ela sobre o bebê, enquanto eu me tornava mais invisível como também
“mãe grávida”. Toda semana eu falava para mim mesma, “Esta semana eu vou contar
para os meus colegas”. Mas outra semana passaria porque eu não consegui
encontrar palavras ou coragem para contar para eles. Eu sabia que deveria
meditar ( fazer daimoku, entoar o mantra NMRK) sobre isso, mas francamente tudo
era tão dolorido para mim que até meditar sobre isso era difícil. Eu estava me
sentindo miserável e depressiva num momento que eu deveria estar muito feliz.
Um dia, 2 meses antes de Maya ( minha filha) nascer, Eu
estava sentada numa sala infantil cantando com as crianças e pensando, Quando
eu vou contar para eles? Quando um dos professores assistentes me perguntou do
nada: Anne-Marie você algum dia pretende
ter filhos?
Eu pensei, vou contar para eles agora: Então, na verdade, eu
vou me tornar mãe agora em setembro.
Eles levantaram as sobrancelhas e olharam de forma engraçada
e surpresa para a minha barriga “chapada”. Então rapidamente eu completei: A
minha parceira é uma mulher e ela está grávida, nós vamos criar o bebê juntas.
Então houve um silêncio na sala. Eles não pareciam chocados.
Eles não pareciam felizes. Eles apenas ignoraram completamente a minha história
e um deles disse: Então, alguém vai fazer churrasco neste final de semana? E
assim eles começaram a conversar sobre os planos para o final de semana. Eu fui
discretamente para o banheiro onde eu chorei muito.
Semanas se passaram e eu fiquei sabendo que nenhum dos
outros professores sabia. Num prédio cheio de mulheres onde todo mundo sabe
tudo sobre todo mundo – ninguém queria contar a minha história. Eu me vi
forçada a contar para as pessoas eu mesma. É tão engraçado como o UNIVERSO te dá
exatamente o que você precisa para crescer, mas naquele momento, não tinha nada
engraçado sobre isso.
Aproximadamente 2 semanas antes do nascimento da Maya –
quando eu sairia na minha licença maternidade – eu decidi anunciar isso na
reunião de professores. Eu estava com frio na barriga, meu coração estava
pesado de medo, mas ao mesmo tempo eu estava querendo terminar com este
sofrimento logo e contar para todo mundo que eu iria ser mãe. Eu ainda tinha a expectativa
que eles ficariam felizes por mim.
Depois que fiz o meu anúncio para todos, o diretor do centro disse alto: PARABÉNS! Tentando
criar o clima para todos os outros. Mas a maioria das caras que eu estava
olhando refletia choque, confusão e surpresa. Umas duas pessoas foram legais,
mas meu foco estava em uma professora que parecia bem crítica e com cara de
julgamento, ela olhava para os outros na sala procurando nos outros colegas
apoio sobre o posicionamento dela.
Eu fui para o banheiro e chorei muito. O problema era que eu
estava desejando a aceitação e apoio deles – eu queria que eles ouvissem a
minha feliz e maravilhosa noticia e entendesse, por tabela, que eu era lésbica.
Não foi isso que aconteceu. Eu fiquei amargurada e humilhada.
Nesta noite eu meditei, entoei o mantra, para chegar a RAIZ
do meu sofrimento. Enquanto eu meditava, eu percebi que carregava dentro de mim
uma profunda e pesada vergonha – uma vergonha que tinha carregado desde a minha
própria infância – uma vergonha tão antiga que eu não conseguia nem colocar
nome nisso. Dentro de mim eu sentia que eu não era boa o suficiente, suja e
totalmente errada. A vergonha que eu sentia da minha vida estava sendo
refletida direto para mim pelo ambiente em que eu vivia. Eu sentei e meditei
com todo o meu coração para extirpar a vergonha da minha vida pela raiz. A cada
mantra que pronunciava eu sentia como se estivesse me resgatando da sujeira.
Todos os dias, duas vezes ao dia, eu continuei meditando para arrancar este
fardo pesado, que era a vergonha, da minha vida.
Na semana seguinte a diretora do centro me perguntou se os
outros funcionários sabiam do meu bebê. Eu disse que não, ninguém tinha contado
para eles. Eu não acreditei quando ela me convidou para uma reunião de todos os
funcionários, onde eu novamente iria ter que contar a novidade de ser mãe.
Eu determinei que eles ouviriam a minha notícia e reagiriam
com a alegria que ela merecia. Após eu contar a história na reunião, houve uma
explosão de parabéns cheios de alegria genuína. Eles responderam exatamente
como eu sempre desejei – com uma alegria pura e verdadeira. As pessoas
começaram a me perguntar: Como a Amy estava e se o bebê já tinha chegado.
A nossa filha, Mary Maya, agora já não é tão bebê, ela vem
comigo para o centro onde eu ensino música. Nós podemos pagar para ela frequentar
o centro. Na sala o apelido que eles
deram para ela é “Pequena Preciosa”. Ela é amada por todos e muito bem cuidada.
A professora que naquele dia mudou de assunto e começou a falar sobre churrasco
no final de semana, me deu uma mala enorme de roupas que eram da filha dela.
Outra professora comprou um lindo presente para Maya quando ela nasceu. Recentemente
outra professora recortou um artigo no jornal sobre casamento gay e guardou
para mim.
Eu não consigo descrever para vocês a INCRÍVEL liberdade que
agora eu sinto por ser capaz de ser eu mesma. Eu estou tão leve e feliz no meu
trabalho. Todos os meus relacionamentos se tornaram mais verdadeiros. Eu agora
almoço com as outras professoras ao invés de ficar escondida na sala. Quando as
pessoas me perguntam sobre a minha vida, eu agora não mais evito a pergunta ou
mudo o assunto da conversa. É difícil de acreditar que eu carreguei aquele peso
por tanto tempo sem perceber que ele existia dentro de mim. Eu sou muito grata
do stress e dificuldade que eu enfrentei para revelar o meu eu verdadeiro.
Através desta jornada eu mudei o meu estado interior de vergonha para CORAGEM,
e como resultado, o meu ambiente mudou dramaticamente.
Eu continuo meditando para que a vergonha das decisões que
tomei na vida se transforme em orgulho. Eu estou determinada a não passar este
tipo de sentimento para a minha filha Maya. Eles falam que as crianças nos
ajudam na prática budista. Eu estou impressionada com as mudanças que esta
pequena vida desencadeou em mim. Mesmo antes de nascer, ela já me ajudava a
cumprir o meu juramento de me tornar absolutamente feliz, agora, eu farei o
mesmo por ela.
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Tradução
não oficial do livro: The Buddha Next Door, ordinary people, extraordinary
stories.
Autores: Zan Gaudioso e Greg Martin
ISBN: 978-0-9779245-1-6